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quinta-feira, 26 de setembro de 2013
SERPA: Sem licença para impedir caça , admite recorrer à Justiça.
Proprietário em Serpa espera há mais de ano e meio que o Instituto da Natureza proíba a caça na sua propriedade. E admite recorrer à Justiça
Em Portugal, é muito mais fácil incluir uma propriedade privada numa zona de caça do que impedir os caçadores de entrar. A burocracia exigida é bastante mais pesada no segundo caso e, por vezes, pode mesmo tornar-se desesperante para os proprietários. É o caso de José Freitas, dono de 25 hectares na zona de Serpa, Alentejo.
Tudo o que o proprietário, de 64 anos, pretendia era impedir que se continuasse a caçar na sua propriedade. Até então, o reformado tinha o seu terreno aberto a este desporto, mas em Janeiro de 2012 decidiu alterar a situação. E apesar de ter seguido todos os passos previstos na lei e das suas sucessivas queixas, mais de 20 meses depois, continua à espera de ver resolvido um processo – que leva, em média, segundo fonte do Instituto de Conservação da Natureza e Florestas (ICNF), apenas um mês a ser concluído.
Aliás, de acordo com o organismo, este ano já foram concedidos 26 pedidos de Direito a Não Caça (DNC). O instituto admite, porém, que nos últimos dois anos ficaram por resolver 11 dos 91 processos que entraram nos serviços.
Um deles será o de José Freitas. “Já gastei dezenas de euros em papéis que nunca estavam bem”, diz o proprietário, explicando que a história tem contornos que lembram a obra de Kafka. Tudo começou em Janeiro de 2012, quando entregou na delegação de Beja do ICNF um pedido de DNC.
“Estava há um ano à espera de poder pôr a placa de não caça, quando fui tentar perceber o que estava errado”, conta, acrescentando que lhe explicaram que a demora se devia ao facto de parte da sua propriedade ter terrenos indivisos. Segundo a lei, para José Freitas poder proibir a caça no seu terreno teria de proceder à divisão das terras. “Mas nesse dia percebi que, entretanto, o meu vizinho _ tinha conseguido transformar a sua propriedade, também com parte indivisa, num couto de caça”, refere, acusando o ICNF de ter “dois critérios absolutamente opostos em relação à mesma lei” quando autoriza a caça em terrenos privados.
Em causa está o facto de, dos 25 hectares totais da herdade, só 18 serem propriedade exclusiva do reformado. Os restantes sete estão incluídos num terreno indiviso de 14 hectares, do qual o seu vizinho é dono de outros sete.
Mas se esta situação tem impedido José Freitas de obter uma licença para proibir a caça, já o vizinho conseguiu que a sua propriedade (também indivisa) fosse incluída numa reserva de caça, sem ter de fazer divisões. Uma prova, nota o agricultor, de que os serviços são mais exigentes para impedir o acesso de caçadores a um terreno do que a conceder licenças para zonas de caça.
Ameaçado com processo
Para atribuir o DNC, o Estado exige uma extensa lista de documentos: identificação completa do proprietário, localização dos prédios rústicos, fotocópia da certidão do registo predial actualizada (com descrição do prédio e o prazo para a atribuição deste direito), planta de localização em suporte digital e ainda uma “declaração onde conste que sobre o prédio não incide qualquer acordo de integração em zona de caça”.
Já constituir uma zona de caça é bastante mais fácil. As autoridades admitem que para autorizar uma destas reservas não fazem, em regra, “a verificação exaustiva da titularidade do terreno” – como estão a fazer no caso de José Freitas – devido ao elevado número de envolvidos. “Não pode ser comparável um processo que pode abranger milhares de terrenos, como as zonas de caça, com um processo que envolve apenas dois ou três proprietários, como acontece com os direitos à não caça”, referiu fonte oficial do ICNF.
Quanto ao processo do reformado, aquela fonte garantiu ao SOL que, “tendo-se constatado a inclusão de prédio em zona de caça sem acordo dos titulares, irão ser tomadas medidas de forma a repor a legalidade”. Mas até ao momento o agricultor não encontra razões para optimismos: em plena época de caça, não só continua sem poder afastar os caçadores, como as suas tentativas para resolver o caso lhe valeram uma ameaça do ICNF de Beja: “Quanto às calúnias deixadas no ar por vossa Ex.ª”, lê-se numa carta que recebeu em Maio, “fica advertido para não repetir qualquer outra difamação, sob pena de ter de provar as ofensas que dirige à honra e à dignidade dos funcionários, assim como do próprio serviço público”. Agora, com o processo a arrastar-se, o proprietário pondera recorrer à Justiça para conseguir o DNC.
sonia.balasteiro@sol.pt
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